quarta-feira, 18 de março de 2009

A Bruxa

A Ana desce a rua, arrogante, senhora da aldeia. Velhos e novos desviam o olhar, fingem-se ocupados. É uma questão de bom senso, nada mais. Afinal, quem quer correr o risco de atrair as atenções da Ana?
A velha Quitéria, parteira da aldeia há 50 anos, é que conta a história. Diz ela que a garota já nasceu com os desígnios trocados. O primeiro sinal foi a coruja, que piou à meia-noite, quando a Teresa se esvaía no parto. A Quitéria jura que foi nesse momento, exactamente à meia-noite, que a cachopa nasceu, a sétima rapariga da casa. A mãe, desalentada, suspirou:
- Chamem-lhe Ana, como a minha avó.
E finou-se.
Foi só o princípio. Se pensam que ficou por aí, enganam-se! Conta a Quitéria que a bebé ficou esquecida no berço quando passava o funeral da mãe. Mau agoiro, toda a gente sabe. Pior: Maria, a irmã, viu o berço à porta e agarrou na criança, levou-a ao cemitério a despedir-se da mãe.
Nem o padre Manuel conseguiu contrariar o destino: entornou a água benta no baptismo da miúda!Há dúvidas? Quando a Ana passa, o melhor é desviar o olhar. É uma questão de bom senso.

2 comentários:

tacci disse...

Gosto muito; e também da concisão.

ana disse...

Gostei muito, também e ainda bem que voltaste.