segunda-feira, 8 de março de 2010

A padaria

Eu adorava o cheiro da padaria, com os fornos nas traseiras e o antiquado balcão de madeira, amorosamente conservado pela D. Assunção, recheado de bolos fofos e cremosos. A avó costumava dizer que era das mais belas padarias do país, com os seus móveis centenários e as arcas frigoríficas habilmente disfarçadas, como nos tempos dos nossos avós, e eu concordo com ela. Naquela altura também concordava, mas não pelos móveis, claro! Pela vitrina! Aquela vitrina era das mais belas visões que povoaram a minha meninice. E um dos mais dilacerantes dilemas, com que diariamente me debatia: ducheses, pastéis de nata, palmiers recheados, croisants de chocolate... todos me seduziam. A escolha afligia-me, mas a Dona Assunção nunca me apressava. Piscava-me o olho e dizia-me:
(...) - Escolhe à vontade, eu não vou a lado nenhum.
Instalávamo-nos no canto da pequena sala da padaria, jogando conversa fora, pondo em dia os meses de ausência. Fazíamos brindes, as garrafas de leite entrechocando-se sobre a mesa: à pandilha!, que é como quem diz, a nós, ao reencontro e às férias todas à nossa frente. Para selar o brinde engolíamos, solenemente, um golo generoso de leite de chocolate. E eu, finalmente convencido pelo aromático tabuleiro recheado de enormes bolas de berlim, directamente saídas do forno para o balcão da D. Assunção, acabava completamente lambuzado de açúcar e creme.
(...)